quinta-feira, 3 de setembro de 2009

MicroRNAs

Nova Classe de Reguladores
Gênicos Envolvidos na Função Endócrina
e Câncee.


MicroRNAs (miRNAs) representam uma nova classe de RNAs endógenos
de 22 nucleotídeos, que atuam como silenciadores pós-transcricionais,
inibindo a tradução de RNAs mensageiros-alvo. Descobertos há pouco
mais de uma década em Caenorhabditis elegans, os miRNAs são hoje
reconhecidos como reguladores fundamentais da expressão gênica em
plantas e animais. Até o momento, identificaram-se 462 genes de miRNA
no genoma humano e estima-se que esse número supere 1000 miRNAs
distintos. Análises bioinformáticas indicam que um único miRNA atue em
diversos RNAs mensageiros, influenciando múltiplas vias de sinalização
concomitantemente e apresentando enorme potencial regulatório.
Apesar da biologia dos miRNAs ser ainda pouco entendida, essas
moléculas já foram relacionadas a diversos processos biológicos. Além
disso, a expressão anômala destes pequenos RNAs tem sido associada a
diferentes patologias humanas, inclusive aquelas relacionadas ao sistema
endócrino e câncer.
Os miRNAs exercem seus efeitos regulatórios ligando-se à
região 3’ não traduzida de RNAs mensageiros (RNAm)-
alvo. Este mecanismo de atuação permite a redução dos
níveis protéicos de seus genes-alvo, raramente afetando o
nível de expressão transcricional (1). Apesar de não terem
suas funções totalmente esclarecidas, a descoberta dos
miRNAs atraiu a comunidade científica pelas evidências
sugestivas de que estas moléculas apresentam papel fundamental
em diversos processos biológicos. Em
mamíferos, estes pequenos RNAs foram associados à regulação
da proliferação, apoptose, diferenciação, hematopoiese,
entre outras funções (4-6). Estudos recentes
enfatizam a importância destas moléculas ao relatar alterações
na expressão dos miRNAs em diferentes patologias
humanas. Neste artigo, sintetizamos aspectos da biologia
dos miRNAs e as atuais descobertas associando estas
moléculas à fisiopatologia endócrina e câncer.
Biogênese dos miRNAs
A biogênese do miRNA, esquematizada na figura 1,
inicia-se com a transcrição de seu gene pela RNA
polimerase II, gerando um longo transcrito de miRNA
primário (pri-miRNA) contendo cap 5’ e cauda poli(A)
(7). O pri-miRNA apresenta uma estrutura hairpin em
seu arcabouço que é clivada ainda no núcleo pela RNase
III, Drosha, e seu cofator DGCR8 (do inglês DiGeorge
syndrome critical region gene 8), gerando uma molécula
precursora do miRNA maduro denominada pré-miRNA,
com cerca de 70 nucleotídeos (8). Em seguida, o prémiRNA
é transportado rapidamente ao citoplasma pela
exportina-5 (Exp5), proteína de exportação nuclear que
utiliza Ran-GTP como co-fator (9). No citoplasma, o
pré-miRNA é processado pela RNase III, Dicer, gerando
um miRNA fita dupla de aproximadamente 22 nucleotídeos
(10). Este produto é incorporado a um
complexo multimérico denominado RISC (do inglês
RNA-induced silence complex), que inclui as proteínas
Argonautas como principais componentes. Apenas uma
das fitas do duplex de miRNA permanece no complexo
RISC para controlar a expressão pós-transcricional de
genes-alvo (11). A expressão alterada de componentes da
maquinaria de biogênese dos miRNAs como Drosha,
Dicer e Argonautas, tem sido associada a diferentes tumores
humanos, destacando a importância desta via no funcionamento
celular adequado (12).
Regulação por miRNAs
A regulação pós-transcricional exercida pelos miRNAs
na região 3’ não traduzida depende do grau de complementaridade
com o RNAm-alvo, podendo ocorrer
por inibição traducional ou degradação do RNAm. O
pareamento de modo imperfeito com o RNAm
acarreta a inibição traducional do alvo, sendo o mecanismo
principal de atuação dos miRNAs em mamíferos.
Em função de os miRNAs possuírem seqüências
pequenas e agirem sem a necessidade de pareamento
completo, um único miRNA pode regular
muitos RNAm-alvo, além de cooperarem no controle
de um único RNAm (13). Alguns estudos indicam que
um miRNA possa regular 200 RNAs apresentando
funções totalmente diversas. Desta forma, os miRNAs
constituem uma enorme e complexa rede regulatória
da sinalização celular. Em plantas, a regulação dos
miRNAs ocorre principalmente através de sua inte-
Arq Bras Endocrinol Metab vol 50 nº 6 Dezembro 2006 1103
Figura 1. Via de biogênese dos miRNAs. O gene de miRNA
é transcrito pela RNA polimerase II. O transcrito primário (primiRNA)
apresenta uma estrutura hairpin, que é processada
pela enzima RNase III, Drosha, formando o miRNA precursor
(pré-miRNA) de ~70 nucleotídeos. A proteína exportina-5
leva esse produto ao citoplasma para ser processado pela
RNase III, Dicer, gerando um miRNA fita dupla de ~22
nucleotídeos. Uma das fitas do duplex de miRNA é
degradada enquanto a outra permanece no complexo
RISC para controlar a expressão pós-transcricional de
genes-alvo.

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